segunda-feira, 23 de junho de 2008

AS FESTAS DE SÃO JOÃO E O CULTO À FERTILIDADE


É tema de dissertações e teses em Antropologia, Sociologia, História e Ciências da Religião. Grandes pensadores e estudiosos da Religião, estrangeiros e brasileiros, têm se dedicado à abordagem do assunto.


Talvez pudesse evocar o grande Mircea Eliade, pesquisador romeno, nacionalizado francês, uma das maiores autoridades em estudos religiosos.

Mas prefiro, neste momento, neste curtíssimo artigo, que tem por propósito tão somente despetar a curiosidade dos caros leitores ao tema, chamar o grande cientista social pernambucano Gilberto Freyre.


Nas festas de São João são lembradas as adorações à deusa romana Juno, deusa da fertilidade. Quando se diz fertilidade esqueçam o quadro inocente de buscar exclusiva de prosperidade do rebanho e do campo; a verdade, é que havia práticas orgiásticas, em adoração aos deuses, na intenção de se obter a prosperidade múltipla, e de se ter o prazer de "usufruir" das benessas do deus a que se prestava culto.


A festa de São João está associada ao culto fálico, do latim, pênis. Muitíssimo comum em culturas antigas, e abraçado disfarçadamente pelo Catolicismo Romano e propagado por séculos.



A situação do catolicismo desenvolvido na Península Ibérica diferencia-se da de outros países europeus, como Holanda, Inglaterra e França, que ficam mais presos aos textos do Cristianismo Primitivo.


Portugal evolui para o catolicismo popular, aglutinando elementos de antigos ritos pagãos à devoção dos santos católicos. E no Brasil, que assimila essa face flexível da religião imposta pelo colonizador, nosso povo assume os festejos juninos com o espírito de uma religiosidade popular complexa e rica, manifestada entre o sagrado e o profano. Louvam-se os santos, preservam-se os símbolos, as crendices, as simpatias e os agouros.


As festas juninas, trazidas para o Brasil como conseqüência da colonização portuguesa, resultam na aglutinação dos cultos pagãos às homenagens aos santos católicos: São José, Santo Antônio, São João e São Pedro. Existem ainda aqueles que incluem São Paulo nas comemorações, pois que seu aniversário de morte acontece no dia dedicado a São Pedro.




As festas têm São João, na tradição católica, como o principal homenageado porque ele simboliza aquele que anuncia a vinda do Messias. Os demais santos são homenageados nos seus dias específicos e têm grande influência no devocionário popular. São José, o protetor da família, nos cultos afro-brasileiros corresponde ao orixá Oxóssi ou Odé; Santo Antônio, protetor dos pobres e casamenteiro, no sincretismo corresponde a Ogum; São João, dono da festa, corresponde ao orixá Xangô; São Pedro, protetor dos viúvos, dos pescadores, dono das chuvas e chaveiro do céu, corresponde ao orixá Exú.


Gilberto Freyre, agora sim ele, diz o seguinteem Casa Grande e Senzala" (pg 224, 225): "Nenhum Cristianismo mais humano e mais lírico do que o português. (...) Cristianismo em que o Menino Deus se identificou com o próprio Cupido e a Virgem Maria e os Santos com os interesses de procriação, de geração e de amor mais do que com os de castidade e de ascetismo. (...) Os azulejos de figuras nuas. De meninozinhos-Deus em que as freiras adoraram muitas vezes o deus pagão do amor de preferência ao Nazareno triste e cheio de feridas que morreu na Cruz."




"No culto ao Menino Jesus, à Virgem, aos Santos, reponta sempre no cristianismo português a nota idílica e até sensual. O amor ou o desejo humano. (...) É Nossa Senhora do Ó adorada na imagem de uma mulher prenhe. É São Gonçalo do Amarante só faltando tornar-se gente para emprenhar as mulheres estéreis que o aperreiam com promessas e "fricções" (grifo nosso)".


É São João Batista festejado no seu dia como se fosse um rapaz bonito e namorador, solto entre as moças casadouras, que até lhe soltam pilhérias:



Donde vindes, São João,



que vindes tão molhadinho?



Ou



Donde vindes, ó Batista,



que cheiras a alecrim?



Impossível conceber-se um Cristianismo português ou luso-brasileiro sem essa intimidade entre o devoto e o santo. Com Santo Antônio chega a haver sem-cerimônias obscenas".



São João, Saõ João "acende a fogueira do meu coração".



E, então vem a questão: "Crente brinca São João?"



Se ele quiser cultuar a fertilidade fálica pagã, sim.



"Não fareis segundo as obras da terra do Egito, em que habitastes, name fareis segundo as obras da terra de Canaã, para a qual eu vos levo, nem andareis nos seus estatutos", Lv 18.3.